Bakken, livro de estreia de Julia Barandier, prima sobretudo pela delicadeza. É com vagar e cuidado que a autora vai sobrepondo camadas de inquietude a sua narrativa, sem incorrer no erro do lugar comum. É com precisão que vai pincelando histórias incertas, preenchendo uma tela em que nada é o que parece.
Acompanhamos, por cartas endereçadas a Marta, a trajetória de Antônio: arquiteto recém-divorciado, muda-se para a Dinamarca, em busca de um novo ofício e, quem sabe, uma nova vida. Lá, conhece Hans, com quem trava amizade e inicia sua jornada como pintor. A partir daí, outras vozes vão sendo introduzidas, esculpindo uma trama fragmentária e polifônica, na qual a arte de imitar o mundo mistura pintura, linguagem e vida.
A solidão vai se revelando aos poucos, não como abandono, mas como um laboratório poético que se expressa na epiderme da linguagem, como se nos alertasse que é pela ausência que nos construímos ontologicamente. Sempre na iminência não trágica do abismo, a imersão na arte conduz a busca por um outro vocabulário, na tentativa de uma sempre renovada dicção, seja na forma como o relato vai se apresentando ao leitor, seja na própria matéria narrada.
Se “estar submerso é pintar-se”, o autorretrato construído aqui é o da própria leitura – do corpo, das imagens, dos sabores. Sem cartilhas ou manuais, o leitor de Bakken perceberá que ocupar esse lugar é saber-se instável e transitório. Talvez seja esse, justamente, o segredo da vida. [por claudia chigres]
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